O Bêbado e a Equilibrista




Olá pessoas! Notando que a seção de Mensagens Subliminares encontrava-se meio desatualizada, gostaria de recomeçar a reavivá-la.
Vamos começar por algo bem leve, porém bizarro. É uma música bem conhecida da maior parte dos brasileiros. Sim! É a famosa canção ‘O Bêbado e a Equilibrista” composta por Aldir Blanc e João Bosco, interpretada por uma das mais belas vozes que o Brasil já teve: Elis Regina.
A história de como eu cheguei até essa música e desvendei seus mistérios foi até curiosa. Em um disciplina da faculdade chamada “Política Externa Brasileira” um professor meu pediu que fizéssemos um trabalho sobre uma música qualquer que fora composta durante a ditadura brasileira. E como eu sabia que a Elis Regina tinha um pé contra o totalitarismo, decidi escolhê-la e essa música. Iniciando minhas investigações eu descobri que esta era um hino contra a ditadura, e é aí que entra a subliminaridade. Primeiro, vamos ouvir essa bela canção com a sua letra.


Sério! Eu fico até arrepiado com esses gritos que ela dá. rs
Mas enfim, prossigamos agora com a análise que eu fiz.
1 – Caía a tarde feito um viaduto
Ao cair da tarde a noite chega, a escuridão, a ditadura. Em 1970 um viaduto desabou sobre carros e ônibus matando muita gente. Na época nada se pode ser noticiado e tampouco as pessoas foram ressarcidas ou indenizadas. O incidente ocorreu em Belo Horizonte, viaduto da Gameleira, década de 1970.
2 – E um bêbado trajando luto
A figura do bêbado representa os artistas, poetas e músicos e outros “loucos”. Embreagados de liberdade ousavam levantar suas vozes contra a ditadura. Geralmente fica-se de luto quando há a morte de alguém. Neste caso o luto foi pela morte da democracia que, conseqüentemente acarretou na morte da Liberdade de Expressão; E também pela morte dos acidentados na queda do viaduto.
3 – Me lembrou Carlitos
Carlitos é como chamamos o personagem de Charles Chaplin, que era um vagabundo. Por isso a menção aos artistas e outros loucos.
4 – A lua, tal qual a dona de um bordel
A lua eram os políticos civis que se colocaram a favor do regime para obterem ganhos pessoais. Em determinadas épocas foram até chamados luas-pretas.*
A Câmara de Deputados e o Senado foram comparados a bordéis em determinada época devido aos negócios imorais que lá se faziam. Por sua vez os cidadãos não poderiam
vir a comentar, pois seriam, no mínimo, processados.
*Eram aqueles que atribuíam aos conselhos recebidos o status de dogma. Se lhe fora dito que a lua é preta é porque a lua é realmente preta sem questionamento. Um exemplo clássico é o de um general dizendo a um político o que fazer sem questioná-lo.
5 – Pedia a cada estrela fria
As estrelas frias são os generais, donos do poder.
6 – Um brilho de aluguel
Era, como mencionado acima, os ganhos pessoais e eleitorais que pelos civis que aceitavam ser marionetes. Alguns civis-marionetes cresceram tanto que chegam até mesmo a passar seus “criadores” em termos de poder.
7 – E nuvens, lá no mata-borrão do céu
As nuvens são comparadas aos torturadores, pois eram intocáveis e inalcançáveis. O mata-borrão é um instrumento antiquado em que, como o próprio nome diz, seu objetivo era apagar os erros, borrões na escrita. O DOI-CODI¹ era a nossa polícia política² da época. O mata-borrão do regime. Já o céu é uma alusão às prisões no sentido de serem inalcançáveis aos cidadãos comuns, aos cidadãos passivos que aceitavam o que lhes foram imposto devido ao medo da ditadura. Nesta canção, os cidadãos incomuns são os “bêbados”.
¹ – O Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) foi um órgão subordinado ao Exército, de inteligência e repressão do governo brasileiro durante o regime inaugurado com o golpe militar.
² – Uma polícia política é um corpo de polícia que serve a interesses de poder político, seja de um governo, de um partido político, de uma guerrilha ou um grupo paramilitar ou terrorista, ou qualquer outra instituição que busque manter uma situação de dominação ou alcançá-la. Diferentemente da polícia convencional, a polícia política não combate tanto criminosos no sentido estrito, mas dissidentes e oposicionistas que são considerados “inimigos” do grupo no poder.
8 – Chupavam manchas torturadas
Os rebeldes eram comparados a manchas, um erro na escrita, uma anomalia, algo fora da ordem ou um indisciplinado, fora dos moldes ditatoriais. Tais manchas (ou rebeldes se preferirem), eram torturados “dentro do mata-borrão no céu, pelas nuvens”.
9 – Que sufoco
A palavra “sufoco” no sentido figurado significa uma situação sem saída, desesperadora. Era assim que os rebeldes se sentiam.
10 – Louco, o bêbado com chapéu-coco
O bêbado se configura-se ainda como o cidadão incomum mas dessa vez importante e conhecido. O chapéu-coco foi um acessório usado pelos homens de negócios londrinos nas décadas de 1950-60. Por estarem em evidência, os artistas importantes poderiam vir a serem taxados de loucos por se expressarem.
11 – Fazia irreverências mil
Reforça a idéia de que os artistas nunca se calaram. Esta própria canção é uma das irreverências mesmo que de forma subliminar.
12 – Pra noite do Brasil, meu Brasil
À época era um tema recorrente. O regresso das liberdades políticas é comparada ao amanhecer. Em contramão, o anoitecer fora comparado à ditadura.
13 – Que sonha com a volta do irmão do Henfil
Henfil foi um cartunista político muito visado pelo regime. Assim como seus dois irmãos, Betinho (sociólogo) e Chico Mário (músico), também havia contraído Hemofilia de sua mãe. Os três morreram de Aids.
Betinho foi um sociólogo que deu assessoria ao MEC e ao Ministro Paulo de Tarso Santos, sempre defendendo reformas. Em 1964 se mobilizou contra a ditadura e devido a repressão foi obrigado a se exilar no Chile em 1971 onde assessorou Salvador Allende até deposição em 1973 devido ao golpe de Pinochet. Voltou ao Brasil em 1979 como Anistiado*.
*Anistia vem do termo grego Amnestia que quer dizer esquecimento. O objetivo primordial da anistia é anular a punição e o fato que a causa.
14 – Com tanta gente que partiu
Os exilados políticos, assim como Betinho.
15 – Num rabo de foguete
Indica uma situação potencialmente perigosa, como uma “furada” ou uma “fria”.
16 – Choram Marias e Clarices // No solo do Brasil
Ambas mulheres de homens mortos pelo DOI-CODI. A primeira era mulher de Manuel Fiel Filho e a outra era esposa de Vladimir Herzog (Na verdade seu nome era Vlado mas considerava seu nome um tanto quanto exótico). Ambos tinham suspeitas de ligação com o Partido Comunista Brasileiro.
17 – Azar, a esperança equilibrista
A equilibrista era a esperança de democracia, um projeto de abertura política gradual, que a cada “eleição”, a cada evento que incomodava os militares (passeatas, etc), tinha sua existência ameaçada. Azar também tem o sentido de “Dane-se”, e ainda é empregado por agentes das forças armadas.
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Nem sempre em todas as vezes as mensagens subliminares necessitam ser menções ao diabo, à coisas ruins e afins. Pode ser uma forma de protesto. E porque não brasileira? Só se dá valor ao que é exógeno? É um ato falho! Eu pelo menos procuro valorizar ao máximo o meu país apesar dos seus pesares.
Não tenho a menor idéia se esse post vai vingar até porque não sei se existe um número elevado de pessoas que gostam dessas mensagens subliminares. Espero que sim. rs
É isso aí pessoas! Espero que tenham gostado porque esse trabalho, à época, foi um PUTA ESFORÇO pra fazer as coisas se encaixarem. Tomei até como pessoal isso :)

DraftL
DraftL
Internacionalista, cientista político e poliglota. Carioca e torcedor do melhor time do futebol mundial da atualidade: Vasco da Gama! Um bon-vivant boêmio que aprecia as diferentes artes, como a música, o cinema e a vida noturna. Se dar bem na noite é uma arte! Jovem mancebo que pulula diante dos seus 23 anos. Para terem uma vida plena, vocês precisam entender que o que está em cima é igual ao que está embaixo e, o que está embaixo, é igual ao que está em cima, para realizar os milagres de uma coisa única. Conhece-te a ti mesmo. O único beco sem saída em todo o universo é a mente fechada.


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