Guaraná Black sem açaí: não se jogue no escuro!

Você já viu a propaganda de
lançamento do guaraná
black da Antarctica
?





Com
o slogan "Se joga no escuro", ela ao mesmo tempo convida o consumidor
a conhecer e aceitar a novidade da marca - um refrigerante à base de
extrato de guaraná, como o tradicional, só que negro - e sugere que o
público se entregue à novidade sem medo dos eventuais riscos ou surpresas que
ela possa representar. Na propaganda que foi para a TV e para a internet, um
surfista enfrenta as ondas do mar à noite. Na analogia, tomar guaraná preto e
surfar à noite são ações que têm em comum uma espécie de experimentação
libertária.
Mas sabemos que não há nada de libertário em tomar refrigerante.
Bebidas adoçadas artificialmente são uma das piores pragas da dieta dos tempos
atuais devido ao volume com que são consumidas por jovens, crianças, idosos,
todo mundo. Elas substituíram a água filtrada, os sucos de fruta espremida na
hora, os chás gelados feitos em casa. Elas se colocaram na propaganda como
sinônimo de felicidade, de união em família, de saúde. Não são nada disso. São
líquidos viciantes que fornecem calorias excessivas a organismos que adoecem e
engordam porque não são devidamente nutridos e hidratados.
A campanha do novo refrigerante da Antarctica é sintomática do
que parece ser a lógica da propaganda na indústria de alimentos e bebidas.
Eu (Francine Lima) nunca trabalhei numa agência de
propaganda, mas posso imaginar mais ou menos como eles pensaram essa campanha.
Por alguma razão, eles devem ter achado que estava na hora de
lançar um refrigerante escuro. Talvez pra concorrer com a Coca-Cola, sei lá.
Tacaram
bastante corante caramelo IV (o mesmo da Coca-Cola), extratos de cenoura roxa e
hibisco (que também são escuros) e puseram o nome de guaraná black. Tá. E????
Por que raios o consumidor compraria isso? Ainda não estava bem resolvida a
novidade.
açaíEntão resolveram colocar um aromatizante
imitação de açaí pra dar um toque de Amazônia pro produto. Logo o açaí, fruta
queridinha de esportistas e gente ligada em saúde. Porque, né, açaí também é escuro. Vai
que cola que o refrigerante é escuro por causa do açaí... Quem, sabe, os
esportistas que curtem açaí acham legal e tal. Ah! Boa! A gente pode focar nos
esportistas e no pessoal meio natureza, que curte aventura. E fazer uma
campanha toda escura com atletas. Gente do surfe. Isso! Boa! Maneiro!

faltava definir um slogan pra campanha. Pra convencer o consumidor-alvo a
escolher o guaraná preto em vez da Coca-Cola. Eles devem ter desejado que o
consumidor se entregasse à novidade assim como se entregam à adrenalina do
esporte. Isso!
Genial! Se joga no escuro!
cair
Sem querer, esse slogan revela exatamente o que o marketing da
indústria de alimentos quer que o consumidor faça. Eles querem que o consumidor
consuma as novidades no escuro, sem saber do que os produtos são feitos, sem
perguntar muito, sem duvidar de nada, na maior confiança, como se a indústria
fosse totalmente confiável. Como se a comunicação mercadológica nesse setor
fosse totalmente transparente e honesta.
Só que não. Infelizmente, não.
Como seria uma propaganda honesta de refrigerante? Talvez com o
Otário falando algo do tipo "se gosta de ser enganado, compre esta
merda!".  Não? Não ia rolar?
Felizmente,
há consumidores atentos que, mesmo sendo fãs convictos de refrigerantes,
perceberam que a marca não foi transparente ao associar o Guaraná Black a um
ingrediente que ele não contém. A página da marca no Facebook se encheu de
comentários e questionamentos sobre essa associação, incluindo fotos da lista
de ingredientes, mostrando que a fruta da Amazônia não aparece nela.
De açaí, no
Guaraná Black, só o aromatizante.
O caso caiu naimprensa. Com a minha participação e de alguns dos meus
seguidores, foi parar no 
Conar.
guarana-blackReprodução: propaganda na internet
Aliás, o Conar deixa passar um moooooooooonte de propaganda
enganosa em todas as mídias. A gente nem confia muito nele, porque ele é
dirigido por publicitários.
Uma dica pros caras: contratem o Otário.
Em uma semana o Otário faria o trabalho que o Conar não faz em um ano... rsrs
Ao pedir que o consumidor se jogue no escuro e forçar uma
associação de um produto nocivo à saúde a uma fruta considerada saudável, a marca
corre o risco de perder credibilidade. Não é honesto tentar conquistar
consumidores fingindo-se de saudável. As pessoas estão ficando mais bem
informadas, e o mercado de bebidas não saudáveis está diminuindo. A indústria
de refrigerantes, se quiser se manter "bem na foto" no mercado daqui
para frente, talvez tenha de encontrar a sua verdadeira vocação neste contexto
de consumidores mais bem informados. Sua vocação não é vender saúde, não é
vender felicidade, não é incentivar a prática de atividade física. Sua vocação
é agradar ao paladar de quem é viciado em açúcar. Apenas. Que tal assumir isso
abertamente?
Esse é
o tema do vídeo da semana no canal Do campo à mesa. Aliás, fuce e inscreva-se pra
não perder nenhuma bagunça que eu faço por lá!



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