Os demônios e a esquerda revolucionária – por Moacir Pereira Alencar Júnior

Os demônios e a esquerda revolucionária – por Moacir Pereira Alencar Júnior

O Romance de Dostoievski, Os demônios, se tornou uma obra de ficção muito conhecida, escrita em 1872, ela tratava da seguinte questão: o justiçamento revolucionário. Quando Dostoievski escreve este livro, ele já tinha sinalizado um descontentamento com os ideais do socialismo. Em vista disso, ele não poupou recursos de cunho estilístico para imprimir as mais contundentes críticas as carateristicas dos ‘reformadores’ , ‘socialistas’ e ‘comunistas’.

Durante a trama do romance, Dostoievski destaca um episódio de justiçamento, inspirado em um fato real. Verkhovenski, um dos líderes de um grupo de conspiradores, tinha constatado que um determinado membro da irmandade iria cometer uma traição – Chatov – e conclui que o mesmo deveria ser executado. Chatov, em um certo momento, declara seu arrependimento em buscar delatar os seus parceiros conspiradores as autoridades czaristas. Entretanto, as circunstâncias pelas quais Chatov passa o convencem a desistir desta intenção.

Um dos membros do grupo de conspiradores, conhecendo as circunstâncias pelas quais Chatov agia, se coloca contra a execução do parceiro perante o grupo. Porém, o líder principal – Verkhovenski – não cede em sua decisão. Portanto, o justiçamento se baseou e se concretizou numa suposição de intenção e não em uma delação efetiva.

Na realidade brasileira podemos destacar um episódio de justiçamento por traição levado a cabo pelo movimento revolucionário brasileiro. No caso, o Verkhovenski do romance de Dostoievski dá lugar a Luis Carlos Prestes, grande líder do PCB . A brasileira que sofre na pele o que Chatov sofreu no romance é a militante do PCB, chamada Elvira Cupello Calônio – conhecida dentro do partido como Elza Fernandes. Ela pertencia a uma família operária , tinha dezesseis anos e era analfabeta, quando em 1934, se tornou companheira de Antônio Maciel Bonfim, celebrizado pelo nome de guerra Miranda, secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro.



Elvira Cupello Calônio – conhecida como ‘Elza Fernandes’

Na derrocada que se seguiu após a Intentona Comunista de novembro de 1935, o casal foi preso pela polícia carioca no início de janeiro de 1936.Libertada pouco depois, a polícia permitiu que Elza visitasse Miranda na prisão diariamente, mais de uma vez ao dia. Nestas visitas, Miranda escrevia vários bilhetes para diferentes pessoas, até então um certo privilégio a um preso político, e estes bilhetes eram transportados por Elza.

Como novas prisões ocorriam, o secretariado nacional do PC passou a trabalhar com a ideia de que Elza fosse uma delatora e uma testemunha de acusação contra os dirigentes presos. Em razão disso ela foi submetida a prolongados interrogatórios por membros da direção partidária. Algumas figuras do partido se puseram enfaticamente contra as suspeitas levantadas contra Elza, caso de José Lago Molares, que de tanto se opor ao caso, veio a ser afastado sumariamente do secretariado.

Como a comunicação era feita única e exclusivamente por intermédio de cartas e bilhetes, a constatação da veracidade das cartas escritas por Miranda seria uma das únicas formas de se comprovar a inocência de Elza no episódio. Neste momento em questão, Prestes e Olga Benário viviam escondidos numa casa no Méier, e comunicavam se com o secretariado nacional por meio de bilhetes e cartas que mensageiros levavam e traziam. Ao saber do ocorrido que envolvia Elza, Prestes foi o primeiro a concluir de forma intransigente que ela seria uma delatora e uma ameaça grave ao partido. Prestes fazia isto sem ter provas documentais e sem analisar com exatidão os indícios de possível traição.

Novos interrogatórios realizados por membros do partido junto a Elza passaram a mostrar nela sinceridade, coerência e firmeza. Em vista disso, o secretariado do partido decide por suspender a sentença de execução levada adiante por Prestes. A análise da documentação deixava entrever uma possível trama policial destinada a orientar suspeitas dos dirigentes comunistas para aquela quase-menina e ocultar os verdadeiros delatores.

Ao saber da posição do secretariado nacional do PC – em defesa de Elza – Prestes acusa os defensores da mesma, de vacilantes, medrosos, e temerosos de sua responsabilidade; reiterando sua posição pela execução da jovem garota. Prestes dizia ter recorrido à memória para o exame da escrita, pois não dispunha de original indiscutível escrita por Miranda, já que cada carta ou bilhete lido deveria ser queimado para não se deixar provas de comunicação entre membros da cúpula do PC.

Conforme destaca o historiador e um dos mais famosos membros do PCB, Jacob Gorender, seria difícil imaginar tamanha leviandade por parte de Prestes, sabendo que da decisão dele dependia a vida de uma companheira de partido. Tamanha leviandade, bem característica do mitológico herói, também conhecido como “cavaleiro da esperança” mostrava um traço de sua formação intelectual – a completa insensibilidade a informações novas que contradigam decisões tomadas com base em pré-julgamentos. Por nenhum momento sequer analisou se a mudança de posição do secretariado estivesse fundamentada em boas razões. Desta forma, o secretariado se rendeu as posições intransigentes de Prestes, e o desfecho foi a morte de Elza Fernandes por estrangulamento com uma corda. O assassinato foi cometido por três membros do secretariado nacional do PC e por mais dois militantes.


Luis Carlos Prestes

Naquele momento delicadíssimo, um mínimo de sensibilidade de sua parte seria vital para salvar a vida de uma companheria inocente , evitando assim o “crime brutal”.

Voltando a obra de Dostoievski: o escritor russo de Os demônios, demonstra que há a verdade da obsessão da traição, que acomete vez e sempre os grupos conspirativos. Mostrando assim, a verdade de que os revolucionários se deixam possuir pelo demônio.

PUBLISHED IN: SEM CATEGORIA ON 18/03/2013 AT 01:48 DEIXE UM COMENTÁRIO
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