Nise - O Coração da Loucura faz louvação da arte no tratamento psiquiátrico

Nise - O Coração da Loucura faz louvação da arte no tratamento psiquiátrico

Longa-metragem está em cartaz nos cinemas do Recife
Publicado em 27/04/2016, às 09h01
Julio Adrião e Glória Pires em cena de Nise - O Coração da Loucura / Vantoen Pereira Jr./Divulgação

Julio Adrião e Glória Pires em cena de Nise - O Coração da Loucura

Vantoen Pereira Jr./Divulgação

Os relatos de amigos e colaboradores da alagoana Nise da Silveira (1905-1999), a médica que revolucionou o atendimento psiquiátrico no Brasil, dizem que ela era tão doida quanto seus pacientes – ou clientes, como fazia questão de tratá-los. Embora esse lado selvagem esteja amaciado na fantástica interpretação de Glória Pires – premiada como Melhor Atriz no Festival Internacional de Tóquio, no ano passado –, o que transparece na cinebiografia Nise – O Coração da Loucura, em cartaz no cinemas recifenses, é o suficiente para vê-la como uma mulher que chutou portas para impor sua visão humanista nos hospícios brasileiros.
Na verdade, o filme não é uma cinebiografia de fato, mas um recorte do trabalho de Nise da Silveira no Centro Psiquiátrico Pedro II, no bairro do Engenho de Dentro, no Rio, em 1944, onde ela implantou a ideia de tratar os clientes esquizofrênicos por meio da arte. Ao contrário dos métodos desumanos da época, que ela testemunhou horrorizada, Nise trocou eletrochoques e perfurações cranianas – usados pelos colegas psiquiatras para lobotomizar os doentes – por tintas, pincéis, telas, cães e gatos. Numa palavra: afeto.
Essa conjunção de métodos heterodoxos, que ela aprendeu estudando a obra do psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, traduziu-se num pioneiro método de tratamento que até hoje tem ajudado os esquizofrênicos a terem uma vida em que a arte suplanta a doença. Nise da Silveira – O Coração da Loucura tem direção de Robert Berliner, um cineasta formado na escola documentária, que já havia demonstrado um apreço especial por seres humanos em dificuldades, como as três irmãs cegas de A pessoa é para o que Nasce, e o músico Herbert Vianna, emHerbert de Perto, em que acompanha o líder do Paralamas após o acidente aéreo que o deixou paraplégico.
Neste seu segundo longa-metragem de ficção, Berliner não só teve uma interprete à altura de Nise da Silveira, como uma trupe de atores fantásticos para viver os doentes que se tornaram pintores reconhecidos pela crítica de arte e que encantaram o Brasil e o mundo. Os atores Julio Adrião (Carlos Pertuis), Fabrício Boliveira (Fernando Diniz), Simone Mazzar (Adelina Gomes), Claudio Jaborandy (Emygdio de Barros), Roney Vilela (Lucio Noemann), Flavio Bauraqui (Octávio Ignácio) e Bernardo Marinho (Raphael Domingues) mereciam um prêmio especial pelo conjunto de suas atuações.
Sem medo de emocionar e jamais descambar para o grotesco, Berliner foi extremamente feliz ao realizar um filme tocante, sem espaço para a tristeza. Ao contrário do choque gratuito, o filme é de uma sensibilidade ímpar, com abertura para o humor e a criatividade que aflora de cada um dos doentes. Apesar de muito conhecida, a história de Nise da Silveira estava pedindo uma versão cinematográfica que exprimisse o quanto ela foi importante para a psiquiatria e a arte brasileiras. 

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