“TODAS AS MONTADORAS ESTÃO PERDENDO DINHEIRO NO BRASIL”

“TODAS AS MONTADORAS ESTÃO PERDENDO DINHEIRO NO BRASIL”


Encontramos Sergio Habib, presidente da JAC Motors do Brasil, no Salão de Pequim; Confira a nossa entrevista

por MICHELLE FERREIRA, DE PEQUIM - 03/05/2016 15h38 - atualizado às 15h55 em 03/05/2016

SERGIO HABIB (FOTO: OSWALDO PALERMO)

Sergio Habib parece estar cada vez mais pessimista. Presidente da JAC Motors do Brasil, o executivo precisou fechar concessionárias depois de ver o número de vendas da marca chinesa despencar 58,5% em 2015. Ele acredita que a economia brasileira demorará até oito anos para se recuperar da crise.

A projeção dramática do mercado e o pessimismo não são exclusivos para a JAC - Habib é proprietário de uma holding que também controla concessionárias das marcas Citröen, Volkswagen, Aston Martin e Jaguar Land Rover, a única da lista que cresceu no ano passado em vendas, 4%. Encontramos com o executivo no Salão de Pequim, na China. Confira a nossa entrevista com ele sobre o mercado brasileiro e o chinês:

Como está o andamento da construção da fabrica da JAC no Brasil?

Nós já alugamos o local onde vai ser a fábrica, em Camaçari (BA). O governo estava cedendo um imóvel para gente, nós fizemos a terraplanagem, mas não vamos mexer nele. O terreno é muito grande, não é o que a gente precisa. Não dá para fazer o investimento que nós tínhamos previsto com a economia atual do Brasil. Com esse novo local, vamos cumprir o que estava previsto e começar a produzir no primeiro trimestre do ano que vem. O primeiro modelo será o T5 automático, CVT. (Nota da reportagem: A linha de produção é orçada em R$ 900 milhões e terá capacidade de produção de 100 mil veículos caso adote regime de dois turnos. Com três turnos, a capacidade salta para 140 mil carros).

Quão grave é a situação do Brasil? Qual é a expectativa de vendas para o mercado no geral?

É esperado que o mercado caia 27% em relação ao ano passado, de novo. O mercado caiu pela metade em dois anos. Com impeachment ou sem impeachment, eu não acho que o mercado cresce este ano porque a economia brasileira está muito machucada, tem muito desemprego. Mesmo se a Dilma for embora, o desemprego deve continuar aumentando, pelo menos no começo. Eu não vejo o mercado reagindo no curto prazo. Para voltar a vender 3,5 milhões, na minha opinião, deve durar sete ou oito anos. Estamos falando aí de 2021, 2022.

Agora o mercado tem que dobrar. Para isso acontecer, o Brasil vai ter que voltar a crescer e nós vamos demorar uns quatro, cinco anos para a renda per capta voltar ao que ela era. Não vai ser esse horror que está agora, mas vai demorar para o Brasil voltar a crescer. O estrago foi grande.

Mesmo com a crise, o preço do carro aumenta. Não deveria ser ao contrário?

O que vai acontecer no mercado brasileiro, na minha opinião, é que preço de carro no Brasil vai continuar a aumentar. Você tem uma pressão de custos enorme, o desemprego deve continuar a aumentar, mesmo se o governo mudar. Eu não estou muito otimista para o mercado de carros este ano. O que acontece é o seguinte: as montadoras no Brasil estão todas perdendo dinheiro. Todas. Carro em dólar no Brasil hoje está bem mais barato do que já foi. Então, a tendência do valor do carro no Brasil é continuar aumentando. Ano passado, nós tivemos 10% de inflação, o valor do carro não aumentou 10% ano passado e o dólar subiu muito mais que isso. A carga tributária no Brasil também é enorme. Nós temos IPI, ICMS e PIS/COFINS – nos EUA não tem nada disso. Hoje, a equação câmbio preço no Brasil é completamente desfavorável às montadoras.

E tem alguma solução? Há algo que dê para fazer?

A gente já viu esse filme no passado no Brasil. Tem muita coisa no carro do país ligado ao dólar: aço, vidro, parte eletrônica, pneu. O dólar sobe e a montadora tem uma super pressão de custo. Tem muita coisa no carro que é importada. Como você corrige isso? Vamos supor que o dólar fique entre R$ 3,30 e R$ 3,50 durante um ou dois anos. Se o carro aumentar 8% ao ano, durante dois anos, melhora a situação para as montadoras. Você corta despesa e a situação melhora.

E na China? Como é o mercado? Como é vender carros na China?

No ano 2000, a China emplacava dois milhões de carros. Em 2010, foram 12 milhões. O ano de grande crescimento do mercado chinês, em quantidade, foi em 2009, quando teve a crise mundial. Nesse ano, o país baixou o imposto, assim como fez o Brasil na época do IPI. Com isso, o mercado chinês pulou de oito para 11 milhões de emplacamentos em um ano, em 2009. O ano passado, o número passou para 24,5 milhões. No primeiro trimestre de 2016, o mercado chinês vendeu 6,6 milhões de unidades. É um crescimento de 6% em relação ao ano passado. O mercado chinês está vendendo 2,2 milhões por mês, que é mais que o marcado brasileiro inteiro. A expectativa é que o número de vendas chegue em 26 milhões este ano. Para você ter uma ideia, o mercado americano vai emplacar 17 milhões.

Isso acontece mesmo com a economia da China crescendo um pouco menos?

O que acontece é o seguinte: a economia da China está crescendo 6,5%, mas o PIB da China hoje é de 14 trilhões. Antigamente, o PIB da China crescia 10%, mas em uma base menor, de sete trilhões. Isso quer dizer que a China está acrescentando mais no PIB do mundo, do que há sete anos, por exemplo.

Chinês gosta de carro grande - os sedãs fazem muito sucesso por aqui, mas agora é a vez dos SUVs. O que mudou?

A primeira coisa que nós precisamos saber: tem quatro cidades na China que tem cota para emplacamento de carro zero. São elas: Chongqing, Shanghai, Shenzhen e Beijing. São cidades de 20 milhões de habitantes onde você só pode emplacar 20 mil unidades por mês. Para se ter uma ideia, o mercado de São Paulo empacava 35 mil carros por mês antes da crise, hoje emplaca 18 mil. Para comprar carro na China, é preciso entrar em um leilão na internet e ficar lá dando lance. O preço médio para comprar uma placa nestas cidades é de US$ 15 mil. Nestas cidades, o cara que compra uma placa a US$ 15 mil não vai comprar um carro de US$ 7 mil. Ele já compra um carro mais caro.


A projeção dramática do mercado e o pessimismo não são exclusivos para a JAC - Habib é proprietário de uma holding que também controla concessionárias das marcas Citröen, Volkswagen, Aston Martin e Jaguar Land Rover, a única da lista que cresceu no ano passado em vendas, 4%. Encontramos com o executivo no Salão de Pequim, na China. Confira a nossa entrevista com ele sobre o mercado brasileiro e o chinês: Como está o andamento da construção da fabrica da JAC no Brasil? Nós já alugamos o local onde vai ser a fábrica, em Camaçari (BA). O governo estava cedendo um imóvel para gente, nós fizemos a terraplanagem, mas não vamos mexer nele. O terreno é muito grande, não é o que a gente precisa. Não dá para fazer o investimento que nós tínhamos previsto com a economia atual do Brasil. Com esse novo local, vamos cumprir o que estava previsto e começar a produzir no primeiro trimestre do ano que vem. O primeiro modelo será o T5 automático, CVT. (Nota da reportagem: A linha de produção é orçada em R$ 900 milhões e terá capacidade de produção de 100 mil veículos caso adote regime de dois turnos. Com três turnos, a capacidade salta para 140 mil carros). Quão grave é a situação do Brasil? Qual é a expectativa de vendas para o mercado no geral? É esperado que o mercado caia 27% em relação ao ano passado, de novo. O mercado caiu pela metade em dois anos. Com impeachment ou sem impeachment, eu não acho que o mercado cresce este ano porque a economia brasileira está muito machucada, tem muito desemprego. Mesmo se a Dilma for embora, o desemprego deve continuar aumentando, pelo menos no começo. Eu não vejo o mercado reagindo no curto prazo. Para voltar a vender 3,5 milhões, na minha opinião, deve durar sete ou oito anos. Estamos falando aí de 2021, 2022. Agora o mercado tem que dobrar. Para isso acontecer, o Brasil vai ter que voltar a crescer e nós vamos demorar uns quatro, cinco anos para a renda per capta voltar ao que ela era. Não vai ser esse horror que está agora, mas vai demorar para o Brasil voltar a crescer. O estrago foi grande. Mesmo com a crise, o preço do carro aumenta. Não deveria ser ao contrário? O que vai acontecer no mercado brasileiro, na minha opinião, é que preço de carro no Brasil vai continuar a aumentar. Você tem uma pressão de custos enorme, o desemprego deve continuar a aumentar, mesmo se o governo mudar. Eu não estou muito otimista para o mercado de carros este ano. O que acontece é o seguinte: as montadoras no Brasil estão todas perdendo dinheiro. Todas. Carro em dólar no Brasil hoje está bem mais barato do que já foi. Então, a tendência do valor do carro no Brasil é continuar aumentando. Ano passado, nós tivemos 10% de inflação, o valor do carro não aumentou 10% ano passado e o dólar subiu muito mais que isso. A carga tributária no Brasil também é enorme. Nós temos IPI, ICMS e PIS/COFINS – nos EUA não tem nada disso. Hoje, a equação câmbio preço no Brasil é completamente desfavorável às montadoras. E tem alguma solução? Há algo que dê para fazer? A gente já viu esse filme no passado no Brasil. Tem muita coisa no carro do país ligado ao dólar: aço, vidro, parte eletrônica, pneu. O dólar sobe e a montadora tem uma super pressão de custo. Tem muita coisa no carro que é importada. Como você corrige isso? Vamos supor que o dólar fique entre R$ 3,30 e R$ 3,50 durante um ou dois anos. Se o carro aumentar 8% ao ano, durante dois anos, melhora a situação para as montadoras. Você corta despesa e a situação melhora. E na China? Como é o mercado? Como é vender carros na China? No ano 2000, a China emplacava dois milhões de carros. Em 2010, foram 12 milhões. O ano de grande crescimento do mercado chinês, em quantidade, foi em 2009, quando teve a crise mundial. Nesse ano, o país baixou o imposto, assim como fez o Brasil na época do IPI. Com isso, o mercado chinês pulou de oito para 11 milhões de emplacamentos em um ano, em 2009. O ano passado, o número passou para 24,5 milhões. No primeiro trimestre de 2016, o mercado chinês vendeu 6,6 milhões de unidades. É um crescimento de 6% em relação ao ano passado. O mercado chinês está vendendo 2,2 milhões por mês, que é mais que o marcado brasileiro inteiro. A expectativa é que o número de vendas chegue em 26 milhões este ano. Para você ter uma ideia, o mercado americano vai emplacar 17 milhões. Isso acontece mesmo com a economia da China crescendo um pouco menos? O que acontece é o seguinte: a economia da China está crescendo 6,5%, mas o PIB da China hoje é de 14 trilhões. Antigamente, o PIB da China crescia 10%, mas em uma base menor, de sete trilhões. Isso quer dizer que a China está acrescentando mais no PIB do mundo, do que há sete anos, por exemplo. Chinês gosta de carro grande - os sedãs fazem muito sucesso por aqui, mas agora é a vez dos SUVs. O que mudou? A primeira coisa que nós precisamos saber: tem quatro cidades na China que tem cota para emplacamento de carro zero. São elas: Chongqing, Shanghai, Shenzhen e Beijing. São cidades de 20 milhões de habitantes onde você só pode emplacar 20 mil unidades por mês. Para se ter uma ideia, o mercado de São Paulo empacava 35 mil carros por mês antes da crise, hoje emplaca 18 mil. Para comprar carro na China, é preciso entrar em um leilão na internet e ficar lá dando lance. O preço médio para comprar uma placa nestas cidades é de US$ 15 mil. Nestas cidades, o cara que compra uma placa a US$ 15 mil não vai comprar um carro de US$ 7 mil. Ele já compra um carro mais caro
.

Comentários