Google pode definir eleições e deve ser controlado, diz
pesquisador de Harvard
João Fellet - @joaofelletDa BBC Brasil em Washington
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Há 9 horas
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Arquivo pessoalPesquisador afirma que Google poderia
determinar o resultado de um quarto de todas as eleições do globo
Em
2012, o pesquisador americano Robert Epstein se enfureceu quando o Google pôs
um alerta de segurança em seu site pessoal.
PhD em psicologia pela Universidade Harvard e
pesquisador sênior do Instituto Americano para Pesquisa Comportamental e
Tecnologia, ele ameaçou processar a empresa, temendo ter sua reputação abalada.
Epstein baixou o tom ao descobrir que o alerta se
devia à invasão do site por hackers. Mas, àquela altura, sua mira já havia se
voltado contra a companhia, que hoje tem nele um de seus principais críticos.
"Ao longo da história, sempre que uma empresa
teve muito poder - estivesse abusando dele ou não - tivemos de criar
proteções", ele diz em entrevista à BBC Brasil.
Na véspera da eleição presidencial na Índia, em 2014,
Epstein viajou ao país para estudar a influência que o Google poderia exercer
em votações. Sua equipe apresentou resultados de buscas sobre os dois
principais candidatos a 2.150 eleitores indecisos.
Um grupo via primeiro artigos positivos sobre um
candidato, enquanto ao outro eram apresentados artigos positivos sobre outro
candidato.
A pesquisa revelou que 24% dos eleitores tinham
propensão maior a votar nos candidatos cujos artigos positivos viam primeiro.
Em alguns grupos demográficos, o efeito atingia 72% dos participantes.
O experimento e pesquisas anteriores lhe fizeram
concluir que o Google - principal site de buscas no mundo - tem o poder de
determinar o resultado de um quarto de todas as eleições nacionais (para
presidente ou Parlamento) do globo, principalmente, as mais disputadas.
Em nota à BBC Brasil, a empresa afirmou que "não
há nenhum fato verídico na hipótese" levantada por Epstein e que jamais
alterou resultados de buscas para manipular usuários (veja, ao fim do texto, a
íntegra da resposta do Google).
Leia abaixo os principais trechos da entrevista,
concedida por telefone.
GettyPoder do Google deveria ser
controlado e monitorado por autoridades, segundo Robert Epstein
BBC
Brasil - A última eleição presidencial no Brasil foi decidida por uma margem de
3,28 pontos percentuais. Acha que o Google pode ter influenciado o resultado?
Robert
Epstein - Eles podem ter não só
influenciado, mas facilmente determinado o resultado. Não posso ter certeza,
mas acho que há uma chance razoável de que isso tenha ocorrido (ainda que
ninguém tenha tido essa intenção).
BBC
Brasil - Há indício de que isso ocorra propositalmente?
Epstein - Só posso especular. Sabemos que o Google e seus
executivos doaram mais de US$ 800 mil para (Barack) Obama e só US$ 37 mil para
(Mitt) Romney (candidato derrotado na última eleição americana, em 2012).
O Wall Street Journal reportou que, na noite anterior à
eleição, Eric Schmidt, à época o presidente do Google, estava pessoalmente
chefiando uma equipe para que as pessoas fossem votar no Obama (Segundo o
jornal, Schmidt estava supervisionando o uso de um sistema eletrônico que
combate abstenções, estimulando simpatizantes de Obama a votar. A reportagem
não diz se ele teria agido como indivíduo ou funcionário do Google).
Então, não há dúvidas de que eles tinham uma
preferência muito forte por Obama. Pela minha pesquisa, nós também sabemos que,
se Obama fosse favorecido em rankings de pesquisa, isso poderia lhe render
muitos milhões de votos nos últimos minutos.
BBC
Brasil - Como funcionaria esse mecanismo?
Epstein
- Quando um candidato está
mais alto nos rankings de busca, isso muda a direção de eleitores indecisos.
Chamamos isso de efeito de manipulação de sites de buscas (Seme, na sigla em
inglês).
Dados do próprio Google mostram que houve mais buscas
logo antes da eleição para Obama que para Romney. Uma forma de gerar mais
buscas é pôr um candidato mais alto em rankings de busca.
Eu tenho certeza absoluta de que um executivo do
Google deliberadamente manipulou resultados de buscas para que Obama ganhasse a
eleição? Claro que não. Isso requer um delator ou uma investigação do FBI (a
polícia federal americana).
BBC
Brasil - Ao agir assim, o Google não minaria sua credibilidade?
Epstein
- É o que eles dizem, mas o
tipo de manipulação de que estamos falando é invisível. Mesmo na nossa
pesquisa, os usuários não tinham consciência de que estavam sendo manipulados.
Eles não perderiam nada ao usar isso para mudar uma
eleição. Também seria legal - não há leis que proíbam isso.
O fenômeno impacta mais que eleitores indecisos. Uma
pesquisa de um instituto alemão mostrou que, ao pesquisar no Google sobre saúde
- por exemplo, câncer de mama -, você recebe dez resultados de busca na
primeira página. Um especialista verá que muitas das páginas contêm informações
imprecisas.
Pode-se ir além. Para qualquer informação que as
pessoas buscarem na internet, há uma boa possibilidade de que o mecanismo de
busca - e não porque alguém queira prejudicar os outros - esteja tendo um
impacto nocivo nas atitudes de centenas de milhões de pessoas.
BBC
Brasil - O que sabemos sobre como os algoritmos do Google são elaborados?
Epstein
- Há milhares de empresas no
mundo todo tentando descobrir isso todos os dias, para que coloquem seus
produtos e serviços mais acima nas buscas.
Nós não sabemos quais são as regras porque o Google
diz mudar os algoritmos entre 500 a 600 vezes por ano.
GettyGoogle diz que muda algoritmo de
busca de 500 a 600 vezes por ano
Mas sabemos que a popularidade de links é um fator que
usam e outro, talvez menos importante, é a quantidade de buscas.
O modelo de negócios do Google envolve pegar
informações que as pessoas pedem e usá-las para aprender sobre as pessoas, de
modo a ligá-las a empresas vendendo produtos e serviços.
Isso significa que, quando ranqueiam a ordem das
buscas, não é necessariamente porque querem que você tenha a melhor informação.
É para que possam ganhar dinheiro.
BBC
Brasil - Como se contrapor a essa influência?
Epstein
- Estamos pensando em
possíveis alertas em navegadores que possam proteger eleitores, dizendo no topo
dos resultados de pesquisas que elas parecem favorecer um candidato ou outro.
Também estamos misturando a ordem de resultados de buscas.
Ao longo da história, sempre que uma empresa teve
muito poder - estivesse abusando dele ou não - tivemos de criar proteções.
Na eleição de 1876, não houve dúvida de que uma
companhia, a Western Union (à época a principal operadora de telégrafos nos
EUA), determinou quem seria o presidente.
Eles fizeram de tudo para que os jornais só
publicassem histórias positivas sobre seu candidato e também compartilharam com
ele toda a comunicação do adversário.
BBC
Brasil - O senhor decidiu pesquisar o Google por causa do episódio em que seu
site foi bloqueado?
Epstein
- É verdade que meu site foi
hackeado e terminei na lista negra por alguns dias. É isso o que me fez me
interessar neles como uma empresa.
Mas o incidente em si não é muito importante. O que
importa é que todos encarem o tema criticamente.
BBC
Brasil - Existe alguma alternativa a sites de busca na forma como vivemos hoje?
Poderíamos viver sem o Google?
Epstein
- A esta altura, não dá para
ter um mundo sem eles.
Muitas pessoas no Parlamento Europeu querem dividir o
Google na Europa em companhias menores. Em vez de ser um enorme mecanismo de
busca, seriam centenas, talvez especializados. Isso nos protegeria, de certa
forma.
Outra possibilidade é que o mecanismo de buscas se
torne público - como a empresa de abastecimento, as companhias que nos dão os
serviços básicos.
E já que o Google é a melhor, talvez se torne a base
para essa empresa pública. Em vez de ser dirigida secretamente, saberíamos
exatamente o que ela está fazendo.
BBC
Brasil - Acha a ideia viável?
Epstein
- Não nos Estados Unidos, mas
na Europa é possível, ou mesmo na Índia. Lá eles são fanáticos sobre a
democracia. É ilegal divulgar dados de pesquisas eleitorais até depois das
eleições, porque eles têm muito medo de que os dados desequilibrem as disputas.
Só é preciso de um país para que a coisa comece. A
maior telecom alemã e o maior grupo editorial europeu querem que o Google e o
Facebook sejam estritamente regulados.
BBC
Brasil - Ao controlar a forma como Google opera, não correríamos o risco de
agir como governos que censuram a internet?
Epstein
- Sim, há um risco tremendo.
Não há maior fã do Google que eu. Eles criaram uma ferramenta extraordinária.
Mas não existe saída fácil.
Não importa se esses novos poderes de manipular estão
sendo abusados neste instante, o que importa é que o poder existe. E isso basta
para que façamos algo a respeito.
***
Leia
a resposta do Google às declarações de Robert Epstein:
"Não há nenhum fato verídico na hipótese levantada pelo
senhor Epstein de que o Google poderia trabalhar secretamente para influenciar
o resultado de uma eleição. O Google nunca alterou a classificação dos seus
resultados de busca em nenhum dos tópicos pesquisados pelos usuários (incluindo
eleições) para manipular a opinião pública. Mais que isso, nós não produzimos
nenhum ranking específico para eleições ou candidatos políticos. Desde o
início, nosso objetivo com a busca é fornecer as respostas e resultados mais
relevantes para nossos usuários e qualquer alteração nesta conduta acarretaria
na diminuição da confiança em nossos resultados e, por consequência, em nossa
empresa."
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